segunda-feira, 6 de julho de 2015

O que a Grécia precisa nos ensinar

Não é surpresa para ninguém que a sanha golpista, que parecia ter arrefecido nos últimos meses, voltou com tudo após a iminência da rejeição das contas de campanha da presidenta Dilma por parte do TCU (Tribunal de Contas da União), bem como das novas denúncias, em particular aquelas de Ricardo Pessoa, da UTC, na operação Lava-Jato. Por exemplo, o congresso do PSDB realizado neste último domingo, que reconduziu Aécio Neves à presidência do partido, deixou claro o que planeja a oposição para o segundo semestre: abreviar o quanto antes o mandato de Dilma e, a partir daí, ou compor um novo governo encabeçado por Michel Temer, ou convocar novas eleições. E, é evidente que essa movimentação só é possível por conta da inédita fraqueza política do atual governo (no Congresso e fora dele), cujos índices de aprovação despencam a cada nova pesquisa.

Não vou entrar no mérito aqui do bombardeio midiático que, há tempos, criou um cenário propício para essa perda de popularidade de uma presidenta reeleita há menos de um ano. Isso, agora, tem menor importância. O que interessa, neste momento, é o fato concreto: de um lado, um governo fragilizado, desacreditado, alvo permanente de denúncias de corrupção, e que enfrenta, ainda por cima, um desgaste natural devido ao mau momento da economia; de outro, uma oposição que, atuando em mais de uma trincheira (PSDB, Eduardo Cunha, mídia) vê-se apta a conseguir aquilo que as urnas lhe rejeitaram inapelavelmente por quatro vezes nos últimos doze anos: retomar sem intermediários o pleno controle do país.

Neste cenário, o que resta a Dilma, ao governo e ao PT? É aqui que o exemplo grego pode ser bastante útil.  Em janeiro, quando o Syriza, partido de esquerda liderado por Alexis Tsipras, venceu as eleições, escrevi aqui que aquele triunfo representava um “sopro de esperança” não apenas para os gregos ou para os europeus, mas, inclusive, para além das fronteiras do velho continente. Ontem, de fato, os gregos mostraram haver outro caminho possível para além do consenso neoliberal. Mas, importa destacar, a histórica vitória do “não” no referendo deste domingo, que representou uma reação popular inédita aos ditames do mercado financeiro internacional, só foi possível pela coragem do governo de Tsipras, que, conforme prometido em sua campanha eleitoral, não se curvou às chantagens do capital especulativo, apoiando-se democraticamente na força do seu povo.

É essa coragem que deve servir de exemplo a Dilma, a seu governo e a seu partido neste momento. Se há uma possibilidade de a sanha golpista da oposição não prosperar, ela passa justamente pelo uso da força da base social que reelegeu a presidenta petista. Dito de modo claro: só se pode evitar o golpe que está sendo desenhado nas ruas, e não nas negociações de cúpula (que se dão com os maiores interessados em que o golpe seja exitoso).

Contudo, aquela base que poderia sair às ruas para defender o mandato da presidenta encontra-se dispersa e desanimada, não apenas porque acuada diante do cerco midiático, mas, sobretudo, porque não encontra apoio nas ações do governo para realizar um contraponto a este cerco. Com efeito, fica difícil pedir aos trabalhadores organizados que saiam às ruas para defender um governo que, em nome da austeridade (contra a qual combateu corretamente durante a campanha) editou duas MPs que – sem tergiversações – representam ataques desnecessários a direitos trabalhistas consagrados. Ou pedir empenho para os sem-terra, depois de colocar a inimiga número 1 do MST, Kátia Abreu, no Ministério da Agricultura (e com direito a efusivos elogios). Na mesma linha, há de se questionar como cobrar dos reitores e estudantes das instituições federais de ensino o mesmo apoio dispensado nas eleições de 2014, quando essas instituições sofrem dia a dia com a falta de recursos oriunda da política de corte de gastos do ministro da Fazenda? Ou querer que os estudantes de baixa renda defendam um governo que, na mesma linha, contingencia verbas destinadas ao crédito estudantil?

Ora, antes que me acusem de “anti-petismo”, de “fazer o jogo da direita”, ou algo do gênero, me parece desnecessário lembrar que entendo haver muitos pontos positivos nos governos petistas, inclusive no que diz respeito aos direitos trabalhistas, à reforma agrária e à educação. Meus textos aí estão para mostrar o que penso a respeito. E é claro que, independente de qualquer avaliação sobre o atual governo, é preciso, acima de tudo, preservar nossa já cambaleante democracia – hoje ameaçada pela onda de proto-fascismo que atravessa nossa sociedade, como escrevi em posts anteriores.

Contudo, me parece claro que apenas se prender ao passado, ou à legalidade, infelizmente pode não bastar. Dilma, o governo e o PT precisam urgentemente reaglutinar sua base para evitar o desfecho golpista. Mas, para isso, é indispensável reanimar essa mesma base, oferecer alternativas reais (e não só retóricas) ao pessimismo que a cerca. Nesse sentido, só há um caminho: reorientar para ontem a política econômica vigente. Do contrário, temo que assistiremos passivamente (ou quase) a derrocada do governo petista (e, por consequência, do próprio partido e da esquerda em geral). Por isso, que me perdoem o clichê, mas, neste momento, há de se mirar no exemplo das mulheres e dos homens de Atenas, e enfrentar sem medo os interesses que devem ser enfrentados.

Honestamente, no entanto, não sei se ainda há tempo para essa reaglutinação, mesmo com uma virada na política econômica, dado o momento delicadíssimo que atravessamos. Mas, é preciso tentar. Até porque, a história costuma ser implacável com aqueles que desistem antes mesmo de lutar.

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