quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Mais um ano que se vai...

2014 foi (melhor: está sendo, já que meu ano ainda não terminou! rsrs) um ano intenso. Primeiramente, e sobretudo, no que diz respeito à minha vida profissional: ano em que terminei meu doutorado e iniciei, com entusiasmo, minha carreira como professor universitário. Ano, sem dúvidas, de desafios inesperados e aprendizados que serão levados para toda a vida. Mas, também, de bastante desgaste.

Felizmente, 2014 foi também mais um ano em que tive o privilégio da companhia e do suporte da minha esposa, Angelica, o que facilitou – e muito – as pedreiras (reais e aquelas que eu mesmo me invento) com as quais me deparei.

Também foi ano de Copa do Mundo – da Copa das Copas, com todas as emoções que a cercaram – e, claro, das eleições mais dramáticas que já vivemos, que me consumiram meses de vida normal, horas de sono, bom humor... Ainda bem que o desfecho compensou os sacrifícios (certo, Dilma?)!

Por outro lado, claro, 2014 foi mais um ano de experiências aqui no blog, que felizmente sobreviveu em meio ao turbilhão deste período. Especialmente por isso, escrevo este post para agradecer a paciência e o carinho de todos os amigos e amigas que passaram por aqui ao longo deste ano e desejar-lhes boas festas e um excelente 2015 para todos nós!

Nos vemos de novo – se nada de extraordinário acontecer até lá – em janeiro!


sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Obrigado, Roberto!

Ainda profundamente entristecido pela perda de Roberto Goméz Bolaños, e emocionado por todas as merecidíssimas homenagens a este gênio do humor, lembrei-me de um momento ocorrido comigo no ano passado, durante um período que morei na França.

Era um domingo, início da tarde, e já estava há algum tempo fora. Sozinho, naquele clima frio, sem vontade de sair de casa, era inevitável que despontasse aquela saudade do Brasil, e das coisas que costumava fazer por aqui. Sem paciência para a televisão, para ler ou estudar, abri o computador e comecei a navegar a esmo pela internet, tentando encontrar algo pra matar o tempo. Foi quando, meio instintivamente, caí no Youtube e me peguei digitando: “Chaves”. Lembro-me que vi uma série de episódios na sequência. Diversão garantida, “deprê” superada e, de repente, me peguei pensando: “como essa gente daqui pode ter crescido sem nunca ter assistido o Chaves?”. Dali em diante, muitas foram as vezes em que, brincando com as inevitáveis comparações que fazemos quando estamos no exterior, eu incluía aquela lembrança: “e esse povo todo, nunca viu o Chaves!”. Só podia lamentar por eles.

Esse pequeno depoimento apenas ilustra o quanto eu admiro o trabalho de Roberto Bolaños. Seus programas, em especial a dupla “Chaves” e “Chapolin”, são possivelmente os únicos que, até hoje, sempre paro para assistir (e quem me conhece sabe bem disso). Pouco importa se sei todas as falas de trás pra frente ou de frente pra trás: eu vejo e me divirto como se fosse a primeira vez!

Aliás, em minha humilde opinião, Bolaños está no patamar de um gênio como Chaplin. Talvez, se fosse norte-americano, também seria mundialmente reconhecido como tal. Por outro lado, o fato de ser latino o torna, para mim, ainda mais grandioso. Com seu humor rico e sem apelações, Chespirito soube unir este continente tão belo e sofrido, culturalmente diverso e fraterno, cheio de dramas e riquezas. Não à toa, é cultuado por todo o território latino-americano.

Por tudo isso, apesar da tristeza incontornável, só me resta agradecê-lo. Pelas risadas, pelos ensinamentos, pelas verdadeiras lições de filosofia, de ética, de sociologia, de vida que você me ensinou desde quando eu me entendo por gente. Muito obrigado, Roberto, e vá em paz!

sábado, 22 de novembro de 2014

Eric Clapton - Layla

22 de novembro, dia do músico. Para marcar a data, um dos maiores guitarristas de todos os tempos, Eric Clapton (não por acaso, apelidado de "Deus"), em uma esplêndida versão ao vivo, de 1999, de seu clássico Layla.

Aproveitem!

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Sobre a ética aristotélica


Para se compreender a ética aristotélica é preciso, em primeiro lugar, observar a distinção operada pelo filósofo entre saber teorético e saber prático. O saber teorético é o conhecimento de seres e fatos que existem e agem independentemente de nós e sem nossa intervenção ou interferência. Por exemplo, os fenômenos naturais. O saber prático é o conhecimento daquilo que só existe como consequência da ação humana. No âmbito do saber prático, porém, ainda é preciso distinguir entre a prática como práxis e a prática como técnica. Nesta última, diz Aristóteles, o agente, a ação e a finalidade da ação estão separados. Um exemplo é o carpinteiro, que ao fazer uma mesa, realiza uma ação técnica, mas ele próprio não é essa ação, tampouco a mesa produzida por ele. Já na práxis, o agente, a ação, e a finalidade do agir são inseparáveis. E a ética refere-se à práxis justamente porque somos aquilo que fazemos e o que fazemos é a finalidade boa ou virtuosa.

Na concepção aristotélica, exposta principalmente em sua Ética a Nicômaco, temos que toda atividade humana visa a um bem. A atividade ética do homem visa o bem perfeito, supremo, ou seja, a felicidade (eudaimonia). O que é esta felicidade? É o bem viver e o bem agir. Como alcançar este fim? É tarefa da reflexão ética indicar o caminho.

Segundo Aristóteles, a felicidade consiste em atividades virtuosas. Com efeito, se a prática ética é o caminho para a felicidade, o indivíduo virtuoso é aquele que sente prazer em agir segundo a “reta razão”. Em outras palavras, é aquele que adquiriu o hábito (ethos) da vida ética.

Neste ponto, importa questionar: mas o que é a virtude que pode nos conduzir à felicidade? Aristóteles assinala a existência de duas formas de virtude, ou de excelência (areté): as virtudes morais e as intelectuais. É a articulação entre ambas que permite definir o sujeito ético. As virtudes morais são adquiridas em resultado do hábito, elas não surgem em nós por natureza, mas as adquirimos pela prática, como acontece com as artes. Já as virtudes intelectuais são o resultado do ensino, e por isso precisam de experiência e tempo.

No que diz respeito às virtudes morais, é preciso frisar que a falta ou o excesso as destroem, como a falta ou o excesso de bebidas e alimentos destroem a saúde. Por isso, se diz que a ética aristotélica visa o equilíbrio, o “justo meio” (mésotes). Com efeito, o excesso é uma forma de erro, tanto quanto a carência. Mas, o meio termo é uma forma digna de louvor. Logo, a virtude é uma espécie de mediana.

A virtude moral não é uma paixão ou faculdade da alma, afirma Aristóteles, mas uma disposição de caráter (exis). Mais ainda, ela diz respeito àquela esfera da realidade na qual cabem a deliberação e a decisão ou escolha. A escolha envolve um princípio racional e o pensamento, ou seja, ela é aquilo que colocamos diante de outras coisas. Seu objeto é algo que está em nosso alcance e é desejado após a deliberação. No entanto, vale lembrar que só podemos deliberar sobre aquilo que está sob nosso alcance. Não se delibera sobre realidades eternas, por exemplo, ou dados naturais. Mas, como o fim é aquilo que desejamos e o meio aquilo que deliberamos e escolhemos, as ações devem concordar com a escolha e serem voluntárias. De fato, o exercício da virtude diz respeito aos meios, logo, a virtude está em nosso poder de escolha.

Em outras palavras, podemos escolher entre a virtude e o vício, porque se depende de nós o agir, também depende o não agir. Depende de nós praticarmos atos nobres ou vis, ou então, depende de nós sermos virtuosos ou viciosos: “O homem é um princípio motor e pai de suas ações como o é de seus filhos”, diz Aristóteles.

Na Ética a Nicômaco, Aristóteles lista uma série de virtudes morais: coragem, temperança, liberalidade, magnificência, magnanimidade, dentre outras. Sem nos alongar neste ponto, convém tão somente sublinhar que a mais importante delas é a justiça. O homem virtuoso é, forçosamente, um homem justo.

Na sequência, Aristóteles se encaminha para a definição das virtudes intelectuais. Como nota o filósofo, a origem da ação é a escolha, e a da escolha é o desejo e o raciocínio em vista de um fim. Logo, “a escolha não pode existir nem sem a razão e intelecto, nem sem uma disposição moral; pois a boa ação e o seu contrário não podem existir sem uma combinação de intelecto e de caráter” (1139a, 30). Assim, a ordem ética não pode existir senão implicando formal e essencialmente a inteligência prática.

A virtude é uma força interior do caráter, que consiste na consciência do bem e na conduta definida pela vontade guiada pela razão. De fato, cabe a esta última o controle sobre instintos e impulsos irracionais descontrolados que existem na natureza de todo ser humano. Dentre as virtudes intelectuais, é a prudência ou sabedoria prática que nos permite deliberar corretamente sobre o que é bom e conveniente para ele. A prudência, para Aristóteles, é, na verdade, uma virtude que é condição de todas as outras e se encontra presente em todas as outras.

O prudente é aquele que, em todas as situações, é capaz de julgar e avaliar qual a atitude e qual a ação que melhor realizarão a finalidade ética, ou seja, entre as várias escolhas possíveis, qual a mais adequada para que o agente seja virtuoso e realize o que é bom para si e para os outros. É ela que permite a escolha racional do meio termo, o domínio da razão sobre a desmesura das paixões.

Mas, a realização ética do ser humano não ocorre de modo segregado. De acordo com Aristóteles, o homem é um “animal político” (zoon politikon). Portanto, sua vida ética se materializa na Cidade, na companhia de outros. Não por acaso, o filósofo assinala que a amizade (philía) é um elemento fundamental para a reciprocidade inerente ao convívio social, ao qual estamos predispostos por natureza. Assim, não basta apenas um governo virtuoso, justo (aquele que governa tendo em vista o bem comum, o justo e o útil para todos), por exemplo, para que uma comunidade desabroche. É preciso que seus membros estabeleçam relações de amizade entre si, tanto quanto a relação entre o governo e os membros da Cidade também deve ser de amizade. Na verdade, é preciso haver uma articulação entre essas relações – o que, no fundo, expressa a articulação necessária, no pensamento aristotélico, entre ética e política. Pois, as formas de governo corretas, justas, implicam na amizade do governante em relação aos governados e são capazes de promover esta virtude nas relações entre os súditos. Por conseguinte, proporcionam um ambiente propício ao bom convívio, às boas ações e à busca da felicidade, o que favorece a conservação do caráter virtuoso do governo. As formas degeneradas, por sua vez, conduzem a uma supressão da amizade, pois aquele que governa, o faz de tal modo a reverter todos os benefícios para si e para os seus, e não para o coletivo. Como consequência, criam obstáculos ao agir ético dos cidadãos e perpetuam a injustiça e os vícios na ordem pública.

Em suma, no pensamento aristotélico, a conduta ética é aquela na qual o agente sabe o que está e o que não está em seu poder realizar. Refere-se, portanto, ao que é possível e desejável para um ser humano. Saber o que está em seu poder significa, acima de tudo, não ser conduzido pelas circunstâncias, nem pelos instintos ou por uma vontade alheia, mas afirmar sua independência e autonomia. Por isso, o filósofo conclui que a felicidade completa só pode ser atingida pela "vida contemplativa", a vida totalmente guiada pela razão.

Com efeito, o sujeito ético ou moral é aquele que não se submete aos acasos da sorte, à vontade e aos desejos de outrem, à tirania das paixões, mas obedece tão somente à sua consciência – que lhe permite conhecer o bem e as virtudes – e à sua vontade racional – que lhe indica os meios adequados para chegar aos fins morais. A busca do bem e da felicidade são, em suma, a essência da vida ética, cuja realização máxima, porém, ocorre no âmbito social, no âmbito de uma comunidade política igualmente virtuosa.

Indicações bibliográficas

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco – diversas edições.

HÖFFE, Otfried. Aristóteles – introdução. Trad. Roberto Hofmeister Pich. Porto Alegre: Artmed, 2008.

PHILIPPE, Marie-Dominique. Introdução à filosofia de Aristóteles. Trad. Gabriel Hibon. São Paulo : Paulus, 2002.


domingo, 2 de novembro de 2014

Primeiros movimentos pós-eleições

Passada uma semana das eleições que consagraram um quarto mandato ao Partido dos Trabalhadores, e já um pouco recuperado da estafa provocada pelo pleito, é hora de retomar as atividades no blog. Infelizmente será preciso, ainda uma vez, e contra minha vontade traçar algumas linhas de análise política. Digo infelizmente porque, com toda sinceridade, desejaria fazer um post tratando de alguma amenidade, ou mesmo de filosofia pura. No entanto, estes dias já foram ricos de fatos e prenúncios do que virá pela frente. E os sinais são inquietantes.

Podemos ver se desenhar no horizonte alguns dos elementos que deverão dar a tônica da política no próximo período. Queria me ater aos dois movimentos que simbolizam, a meu ver, o confronto político que se estabelecerá no início do segundo mandato de Dilma, e que nos obrigam a deixar o sinal de alerta ligado.

Do lado da presidenta, a vitória por estreita margem, a dificuldade em dialogar com alguns setores influentes da sociedade e, mais importante, a percepção de que o projeto transformador que ela encarna encontrou seus limites nos atuais padrões de governabilidade, levaram Dilma a propor repactuar o país em torno daquela que, corretamente, ela diz ser a “mãe de todas as reformas”: a reforma política. A estratégia me parece a mais pertinente. Como já afirmei reiteradamente por aqui nos últimos anos, de fato, apenas uma reforma política capaz de radicalizar nossa democracia pode abrir uma saída positiva para resolver os históricos problemas estruturais do país. Contudo, temos visto como esta agenda está longe de ser consensual, em especial num Congresso cada vez mais conservador. Por isso mesmo, tirá-la do papel exigirá uma ampla capacidade de mobilização de partidos e movimentos sociais de esquerda, além do próprio governo, em torno do tema. Este gesto, porém, tenderá a aumentar a temperatura do debate político, fenômeno que, se não for bem controlado, pode se reverter contra o próprio governo e o PT.

Do lado da oposição, por sua vez, a tentativa para os próximos meses parece clara: de um lado, obstruir mudanças no Congresso – vide o que ocorreu com o decreto do programa de Participação Social; de outro, desestabilizar o governo, tentando a todo custo retirar sua legitimidade – no limite, criar as condições para seu impedimento. Sempre, claro, com a preciosa ajuda de setores da grande imprensa (daí que o próprio debate acerca da reforma política terá de ser feito com paciência e cuidados redobrados). O patético pedido de auditoria das eleições proposto pelo PSDB, somado à não menos patética – embora mais preocupante – manifestação deste sábado, em São Paulo, pedindo uma intervenção militar no país, são gestos iniciais paradigmáticos dessa estratégia.

Assim, é no cruzamento destes dois vetores que se jogará o futuro brasileiro no curto e, provavelmente, no médio prazo. Se a política é uma disputa de forças, a tensa conjuntura atual reclama maturidade ao conjunto das forças de esquerda e centro-esquerda (no Congresso e na sociedade civil). Pois, mais do que nunca, é preciso se unir em torno de um programa mínimo, tendo como eixo a reformulação de nosso anacrônico sistema político – algo que, aliás, já tem sido esboçado desde o segundo turno das eleições, mas que urge prosseguir –, para fazer o vetor resultante deste confronto pender para o lado progressista. Apenas assim, a meu ver, será possível isolar os germes de golpismo presentes em setores da oposição (e que, certamente, serão mais e mais alimentados por parte da grande mídia), e recuperar a capacidade de impor uma pauta avançada de reformas que o Brasil tanto necessita. Não é uma tarefa simples, pois é inegável que o ambiente político está acirrado como talvez nunca antes (em um passado recente, ao menos). Contudo, este é o desafio que a história nos legou. Resta-nos, então, encará-lo de frente, sob pena de, em caso de fracasso, não apenas vermos a esquerda e seu projeto se esfacelarem – é assumidamente o que desejam os oposicionistas – mas, além disso, assistirmos o país retroceder a níveis (sociais, políticos, econômicos, culturais) que imaginávamos completamente superados.

sábado, 25 de outubro de 2014

Amanhã é dia de reeleger Dilma presidenta, 13!

Hoje termina a campanha mais surpreendente e tensa do período pós-redemocratização. E após uma longa temporada de intensa polarização (primeiramente entre Dilma e Marina, depois entre a petista e Aécio), cresce a certeza de que a disputa que esteve desde o início colocada era se queríamos avançar no sentido de construir um país mais democrático, inclusivo e soberano, ou se queríamos retomar a trilha neoliberal dos anos 1990, em que o mercado, e não o povo, é o centro da política.

Os programas televisivos, os debates e, principalmente, o trabalho da militância nas ruas mostraram, a quem ainda tinha dúvidas, o melhor caminho a seguir. Por isso, cada vez mais e mais pessoas têm a certeza do que fazer neste domingo:

- Amanhã é dia de se erguer contra o ódio, o preconceito e a intolerância.

- Amanhã é dia de ver a verdade e o povo brasileiro triunfarem sobre a mentira propagada por uma minoria que se incomoda pelo bem estar dos demais.

- Amanhã é dia de votar, não contra um candidato, mas a favor de um projeto político que tem mudado positivamente a cara do nosso país.

- Amanhã é dia de reeleger Dilma presidenta, 13!

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

10 dias para escolher o futuro do país

Passado o período da “onda Aécio”, o fato é que, a 10 dias das eleições, temos um pleito completamente indefinido. Talvez, a única certeza seja de que o país sairá dessas eleições dividido – suspeito que como nunca antes. Difícil apontar ainda as consequências dessa situação. Por ora, prefiro me concentrar nos fatores que podem fazer a balança pender para um lado ou para o outro nesta reta final.

Há uma margem muito pequena de eleitores ainda em disputa. Há uma parte grande que não votará no PT de forma alguma, isto está claro. Mas, se a percepção de Josias de Souza (leia aqui) está correta – de que os aproximadamente 6% de indecisos em “disputa” se situam na tal “nova classe média” (na verdade, em setores que foram inseridos na classe trabalhadora) – a situação pode ser mais favorável a Dilma. Afinal, é graças aos governos petistas que estes eleitores se encontram em melhor situação sócio-econômica do que antes. O ponto, portanto, é reforçar esta percepção ao contingente que ainda não se convenceu disto. Para isso, os programas eleitorais, mas, sobretudo, os debates podem desempenhar um papel decisivo.

No encontro da última terça, por exemplo, Dilma soube desconstruir Aécio, tornando um tema aparentemente desvantajoso a seu governo, a corrupção na Petrobrás, em uma saraivada de denúncias contra os governos do PSDB (na verdade, de constatações) que acuaram o candidato tucano. Outras atuações como esta, nos debates que restam (a começar pelo de hoje, no SBT), podem demonstrar para o eleitor, sobretudo para estes indecisos, que Dilma é a candidata mais apta a fazer as mudanças que o país precisa sem comprometer as conquistas obtidas até aqui. Nesse sentido, Dilma tem sabido pontuar corretamente a existência de dois projetos políticos antagônicos para o país, mostrando que sua candidatura é a única que representa “mais mudanças” para a população mais necessitada. Por isso, na campanha de rua, nas redes, nos programas de TV, e nos debates, entendo que é essa a tônica a ser adotada: reforçar a polarização política e mostrar para essa parcela dos indecisos que apenas o projeto materializado na candidatura de Dilma pode continuar a melhorar a vida deles. O embate está colocado. Estes últimos 10 dias serão de muita luta!

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Breves considerações sobre o 1º turno e os desafios do 2º

Com a cabeça mais fresca, depois de um dia cansativo, é possível fazer algumas considerações e balanços sobre o primeiro turno das eleições.

Sobre a disputa presidencial, evidentemente, houve uma surpresa no resultado. A votação bem acima das expectativas de Aécio, e a votação um pouco abaixo do esperado de Dilma (Marina manteve-se no mesmo patamar de 2010), farão com que o segundo turno seja uma verdadeira batalha. São Paulo foi, sem dúvidas, a mola propulsora da arrancada tucana, e é neste Estado – que mais uma vez expressou seu conservadorismo em todos os níveis eleitorais – que pode estar a chave da vitória no dia 26/10. Dilma e o PT devem ter atenção redobrada por aqui. Não para vencer, mas para minimizar a diferença de quatro milhões de votos que o tucano impôs sobre a petista.

Além disso, naturalmente, é preciso disputar os votos de Marina. Esta, aliás, é a grande questão, do ponto de vista, eleitoral, deste segundo turno: para onde migrarão os votos depositados ontem no PSB? É preciso lembrar que o eleitorado marineiro era composto essencialmente de duas fatias contraditórias. A primeira, de jovens, em especial de grandes centros, que enxergavam nela a vocalização das manifestações de junho do ano passado. A segunda, um eleitor conservador, em sua maioria evangélico, que encarava Marina como a candidata mais apta a “tirar o PT do poder”. Difícil dizer qual era majoritária (se é que havia), mas tendo a apostar nesta última. E, se for assim, há de se levar em conta que parte dele migrou para Aécio já no primeiro turno, especialmente em SP. Sendo assim, a margem de transferência pró-tucano se estreita, e deve haver uma disputa equilibrada por estes votos. Contudo, convém ainda aguardar as movimentações desta semana. Inclusive, um eventual apoio público de Marina ao PSDB, já sinalizado na noite de ontem, para considerações mais precisas.

De qualquer forma, o PT deve primeiramente concentrar suas forças, a meu ver, para atrair essa parcela do eleitorado de Marina de corte mais progressista. Para isso, é preciso fazer novamente deste segundo turno uma disputa ideológica polarizada. Não há espaço para erros e tergiversações. É o PT, o campo popular-democrático e seu futuro, contra o bloco conservador do anti-petismo que se enfrentarão até o dia 26. Até porque, é sempre necessário lembrar: Aécio, turbinado pelo seu desempenho e a virada improvável no primeiro turno sobre Marina – o que já o deixaria em uma situação positiva para o segundo turno – terá o apoio irrestrito da grande mídia, o que é sempre de grande valia. Vide o que ocorreu na disputa para o governo de SP, em que Alckmin, blindado pelos grandes meios de comunicação, conseguiu a reeleição em primeiro turno, mesmo com o estado em frangalhos.

Em resumo, a disputa será acirrada. Mais do que o previsto, talvez. A nova-velha composição do Congresso também indica um fortalecimento de candidaturas de centro-direita e de direita que é preocupante. Via de regra, é fato, o Congresso Nacional tem perfil conservador, sobretudo por conta da influência do poder econômico nas eleições. Em 2014, porém, houve um aprofundamento deste perfil: não apenas o centro e a centro-direita ampliaram sua representação, mas candidatos que podem facilmente ser identificados à direita mais nefasta (ou extrema-direita, se preferirem), como Bolsonaro (RJ), Heinze (RS), Feliciano (SP), tiveram votações absolutamente expressivas. Por outro lado, é notável que a bancada do PT, mesmo com perda considerável, ainda seja a maior da Câmara – o que mostra o enraizamento do projeto petista em grandes parcelas da população, apesar de tudo. 

Enfim, dá para dizer o seguinte: se vai ser intensa, a batalha que começamos hoje também não será mais árdua do que outras que enfrentamos. Nesse sentido, nunca é demais lembrar: uma vitória em primeiro turno de Dilma era mesmo muitíssimo difícil de ocorrer. E, acima de tudo, convém não esquecer que foi Dilma e o PT quem venceram o primeiro turno, que venceram a sétima disputa presidencial das últimas sete disputadas. À oposição, portanto, devagar com o andor (porque seu santo é literalmente de barro). Aos petistas, é hora de arregaçar as mangas, defender nosso projeto, e disputar com energia e de cabeça erguida os rumos de nosso país.




quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Está chegando a hora!

Está chegando a hora! Amanhã termina o horário eleitoral gratuito de rádio e televisão. Teremos o último debate entre os candidatos à presidência da República e, com ele, o fim do primeiro turno da campanha eleitoral de 2014.

No que diz respeito à disputa pelo Palácio do Planalto, atingimos estes últimos dias com duas grandes questões (que apreciam improváveis há alguns dias ou semanas): é possível uma vitória de Dilma já no primeiro turno? Caso ela não ocorra no próximo domingo, seu adversário no segundo turno ainda pode ser Aécio Neves?

Para mim, nos dois casos, a resposta é: sim, é possível, mas pouco provável. O PT nunca venceu no primeiro turno uma corrida presidencial e, conquanto as pesquisas sinalizem que Dilma pode superar a barreira dos 45% dos votos válidos, ainda entendo ser muito difícil ela conseguir a metade mais um já no dia 5. Não é impossível, como disse, mas eu prefiro não arriscar. Não contar com esta hipótese e me decepcionar com um “revés”. Isto aconteceu com parte da militância em 2010, que contava com uma definição no primeiro turno e, quando ela não veio, esmoreceu no início do segundo, dando margem a um crescimento de Serra naquele momento. Por isso, prefiro me concentrar apenas na perspectiva de acumular o maior número de votos possíveis agora, para garantir um segundo turno mais tranquilo. Sabem como é, cautela e canja de galinha...

Nesse sentido, imagino que Dilma deverá ficar, em um bom cenário, na casa dos 48, 49% dos votos válidos, o que significa uma vantagem muito considerável para o segundo turno. Segundo turno este que, a meu ver, deverá mesmo ser disputado contra Marina Silva. Apesar de sua candidatura “fazer água” dia após dia, creio que não haverá tempo hábil para uma recuperação definitiva de Aécio Neves (imagino que a diferença entre ambos deva ficar entre 2 a 3% dos votos válidos, algo como 25% a 23% pró Marina). Infelizmente, porém, o que poderia ser um segundo turno disputado em um patamar mais progressista, que pudesse abrir um período de pautas mais à esquerda nos próximos anos, reproduzirá, em sua essência, a antiga polarização entre PT x PSDB. Isso por conta da inflexão notória da candidatura do PSB à direita, alinhando-se a pautas estranhas a seu programa original.

Mas, sobre o segundo turno, falaremos depois. Por ora, apenas reafirmo meu voto em Dilma Rousseff, pois entendo ser a única candidata, neste momento, capaz de conduzir algumas das reformas mais urgentes no Brasil: a reforma política, a democratização das comunicações (compromissos públicos já assumidos), além de outras, como a tributária, a urbana e a agrária. Votar em Dilma não é garantia de que essas reformas irão avançar (e isso vale para qualquer candidato ou candidata). Afinal, política não se faz apenas na base da vontade. E , nunca é demais lembrar, o próximo Congresso, eleito sobre a base do financiamento privado, deverá reproduzir os vícios do atual, dificultando o avanço das pautas progressistas. Ainda assim, se pode haver mudanças neste sentido, é certamente com Dilma na presidência que elas deverão ocorrer!


Por fim, gostaria de justificar uma lacuna, referente à eleição estadual de SP. Ao contrário de 2010, neste ano não consegui escrever, no blog, nada a respeito desta disputa fundamental. Para mim, como todos os leitores e leitoras do blog devem supor, a provável reeleição de Alckmin no próximo domingo representará um completo desastre para o estado. Mas, entendo que os motivos desta eventual catástrofe, bem como as razões pelas quais a candidatura petista de Alexandre Padilha parece não ter deslanchado como se esperava (embora seja, de longe, o candidato mais preparado para fazer SP avançar social e economicamente, como ficou claro, mais uma vez, no debate desta terça-feira), seriam temas para uma reflexão de maior fôlego. Reflexão esta que, infelizmente, não tive tempo de fazer. No entanto, espero poder escrever algo a respeito uma vez passadas as eleições e com os resultados definitivos. Afinal, quem sabe, depois das sucessivas mentiras contadas por Alckmin na noite de ontem (negando, por exemplo, o racionamento de água em SP), as urnas não nos reservam uma agradável surpresa no próximo domingo?

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

100 mil visualizações!!!

Nesta semana, o blog ultrapassou a expressiva marca de 100 mil visualizações desde que foi ao ar, há pouco mais de quatro anos. Isso significa uma média excepcional de cerca de 25 mil visualizações por ano, mais de 2 mil por mês ou cerca de 70 visualizações diárias!

Registro, aqui, minha alegria e meus sinceros agradecimentos a tod@s que tem prestigiado este espaço.

Muito obrigado pessoal!!!

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

A grande questão das eleições: votaremos por mais ou por menos democracia?

As últimas pesquisas da corrida presidencial colocaram a disputa em um patamar mais factível. Passada a comoção pela morte de Eduardo Campos e o turbilhão causado pela entrada em cena de Marina Silva, temos agora um cenário menos emotivo e mais cristalizado. Nele, a presidenta Dilma lidera, com alguma folga, a disputa do primeiro turno, e estaria em empate técnico com a candidata do PSB no segundo.

Nesta situação, vale ainda dizer, a possibilidade de Dilma vencer ainda em primeiro turno existe (ela teria, em média, entre 40 e 45% dos votos válidos, segundo as pesquisas). Mas, honestamente, como já disse aqui em outros posts, não creio que essa possibilidade possa se tornar realidade. Logo, tampouco entendo que a militância pró-Dilma deva se pautar por ela. É preciso ter humildade e pé no chão nesta reta final de campanha.

Mais ainda: ao que tudo indica, não apenas teremos um segundo turno, como a disputa, doravante, deverá ser bastante equilibrada e singular. Ao galgar apoio dos setores mais conservadores (como o Clube Militar e o pastor Silas Malafaia), adotar práticas estranhas à sua biografia (como a censura ao site Muda mais, de simpatizantes da presidenta Dilma), e incorporar grande parte do programa tucano ao seu, sobretudo na economia (como a independência do Banco Central, a revisão da CLT e do modelo de partilha do pré-sal), Marina selou sua candidatura com um surpreendente e infeliz giro à direita. E este giro, contraditoriamente combinado com uma posição messiânica da candidata, auto-proclamada a encarnação do “espírito de junho” e da “nova política”, tem tornado essas eleições extremamente perigosas.
Sobretudo porque essas ambiguidades da candidatura do PSB têm permitido a alguns setores, mais do que a candidatura tucana autorizaria, suprimir o debate de ideias, e dar vazão a um irracionalismo inédito, na medida em que opõem, ao petismo e seus simpatizantes, um anti-petismo que atingiu, em várias camadas, níveis doentios inéditos, de ódio – como se o PT fosse o responsável por todos os males que assolam o país (leia aqui o post que escrevi sobre a “doença do anti-petismo”, em abril deste ano). Nesse quadro, Marina se beneficia justamente por se apresentar como a materialização daquele sentimento difuso (que, muitas vezes, tem vergonha de se explicitar), ao mesmo tempo em que parece estar imune ao ranço negativo que persegue os tucanos – inclusive Aécio – desde o fim do governo FHC.

Diante disso, entendo que a polarização irracional promovida pela frente anti-PT só pode ser vencida pelo aprofundamento do discurso político. Isso significa compreender que a disputa não se dá no terreno tecnocrático (quem é a melhor administradora), tampouco no desprezível discurso de ódio recíproco (que é arma dos que não têm argumentos), mas no plano ideológico. Estão em debate dois projetos antagônicos de país: um, democrático-popular, que com seus inúmeros acertos e, sem medo de dizer, também com seus erros, insuficiências e contradições, tem feito o Brasil um país menos desigual, mais democrático, inclusivo e soberano. O outro, de corte neoliberal, cuja adoção significaria interromper o caminho de superação de nossos problemas crônicos, retroceder nos avanços sociais e lançar o país no caos econômico que atingiu a Europa e os EUA nos últimos anos. Um projeto subserviente aos interesses de uma minoria – os operadores do capital financeiro internacional e os grandes empresários – que se beneficia com essa situação.

Ora, o que a adesão a estes projetos sinaliza, ao fim e ao cabo, é a própria possibilidade de aprofundarmos a democracia brasileira (política, econômica e socialmente), ou de retrocedermos a um estágio do país para alguns poucos. Por isso, entendo que, no limite, a questão central dessas eleições é a seguinte: votaremos por mais ou por menos democracia? Por baixo da nuvem de ódio que se tenta criar, é esta a disputa essencial do pleito de 2014. É isso, por conseguinte, que precisa, cada vez mais, ser explicitado para toda a população.


quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Aidar e os desafios do SPFC

Uma pausa na política nacional. Não podia deixar passar a entrevista concedida à Folha, nesta quarta-feira, por Carlos Miguel Aidar, presidente do São Paulo (leia aqui). Aidar afirma ter encontrado o SPFC “muito pior do que imaginava”, e constata o óbvio: “o São Paulo parou no tempo”. Foi justamente essa evidência que fez com que muitos – o autor deste blog, inclusive – apoiassem (em meu caso, à distância) a oposição nas eleições do São Paulo, ocorridas em abril.

Não vou entrar na questão, aqui, sobre a “traição política” de Aidar, que só venceu o pleito graças ao apoio de Juvenal Juvêncio – o mesmo Juvenal que, agora, ele acusa de ter endividado o clube além do que se sabia e de administrá-lo de modo ultrapassado. A meu ver, é pouco crível que o atual mandatário são-paulino não tivesse ciência da situação do clube e, sendo candidato da situação, soa estranha a acusação à (falta de) competência administrativa de seu predecessor. No entanto, o que mais me interessa, nesse momento, é sua salutar disposição em mudar os rumos do clube nos próximos anos: equacionar as dívidas e impor uma administração mais profissional, sem descuidar do time de futebol – que é a razão de existir do SPFC.

Como o próprio presidente reconhece, a tarefa é difícil. Mas, felizmente, os alertas que muitos faziam há tempos em relação ao anacronismo representado por Juvenal Juvêncio, foram captados por Aidar. Que ele consiga, então, recolocar o São Paulo em sua trilha natural de conquistas, fazendo do clube, novamente, um modelo para os demais. É o que os são-paulinos mais desejam!


domingo, 31 de agosto de 2014

Nova política? Só com uma Reforma! - Nessa semana, participe do plebiscito popular!

Entre os dias 1º e 7 de setembro, setores organizados da sociedade farão, em todo o Brasil, um plebiscito popular por uma Constituinte exclusiva para a reforma política. Com valor apenas consultivo, o plebiscito contará com uma única pergunta: “Você é a favor da convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva para a reforma política?” A iniciativa é importante, entre outros motivos, porque sintonizada com as aspirações dos movimentos que eclodiram em junho do ano passado e com a força política surgida de lá para cá, especialmente entre os jovens. Com efeito, a reforma política é o primeiro passo para a realização das mudanças estruturais justamente cobradas nas ruas, e que o Congresso, em sua maioria tomado por parlamentares preocupados apenas com seus interesses, frequentemente bloqueia.

Escrevi um texto a respeito do plebiscito e da importância da reforma há algumas semanas, publicado na revista Teoria e debate (leia aqui). Depois disso, vale observar, a entrada de Marina Silva na disputa presidencial reacendeu a polêmica acerca de uma "nova política". No entanto, não podemos nos deixar enganar: não há atalhos, soluções mágicas, ou messiânicas. Não pode haver mudança na forma de se fazer política sem mudança nas regras do jogo! Por isso, para que as transformações que tanto ansiamos saiam do papel, é imprescindível uma reforma política. Assim, se você quer outra política, um salto de qualidade nos serviços públicos ofertados pelo Estado, reformas de base como a agrária, a urbana e a tributária, maior participação e uma maior sintonia entre a classe política e as necessidades populares, não deixe de participar do plebiscito popular nessa semana!

Maiores informações e locais de votação: http://www.plebiscitoconstituinte.org.br/

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O primeiro debate e o início da desconstrução de Marina

Na noite desta terça-feira, 26/08, foi realizado o primeiro debate entre os candidatos e candidatas à presidência da República. Em que pese o péssimo horário de início (22h) e sua longa extensão (foi até 1h), entendo ter sido um dos melhores dos últimos tempos, com uma participação geral bastante razoável e, sobretudo, com potencial de importantes consequências para a disputa eleitoral.

Em geral, um debate serve, primeiramente, para demarcar campos políticos. Com este não foi diferente. Entre os candidatos “nanicos”, a surpresa positiva ficou por conta de Eduardo Jorge, que debatendo temas como aborto, legalização das drogas e reforma política, posicionou o PV na órbita da esquerda como há muito o partido não se posicionava. Luciana Genro manteve o discurso do PSol e, não fosse a chatice do ressentimento com o PT (típico da maioria dos ex-petistas, diga-se), poderia ter tido uma atuação melhor. Tem boas propostas, também tocou em temas importantes, como a laicidade e a questão indígena (esta, um dos pontos fracos do atual governo), mas a meu ver, não dialogou verdadeiramente com sua base em potencial, os trabalhadores. À direita, Pastor Everaldo martelou sua proposta de privatizar tudo, menos as preferências e orientações sexuais alheias. E Levy Fidelix, o mais fraco dos sete presentes, foi um peso morto.

No que se refere aos principais concorrentes, a primeira expectativa era saber como se comportariam após a divulgação da pesquisa do Ibope, poucas horas antes, que mostrava um crescimento de Marina na segunda posição e queda especialmente de Aécio, pela primeira vez em terceiro e distante da candidata do PSB.

Curiosamente, o tucano, que teve boa postura ao longo do debate, não atacou sua agora rival direta e preferiu concentrar-se em Dilma. Na minha opinião, perdeu todos os embates com a presidenta. Além disso, bateu na tecla de que teria feito uma “ótima gestão” (sic) em Minas Gerais e apresentou, como “novidade”, Armínio Fraga como seu nome para o ministério da Fazenda. Obviamente, não convenceu. Na verdade, embora fale bem, Aécio é tão vazio de conteúdo que, a continuar assim, arrisca-se a perder ainda mais espaço na corrida presidencial.

Dilma teve um desempenho muito melhor do que nos debates de 2010. Conquanto tenha sido alvo preferencial de todos os demais candidatos, em nenhum momento saiu-se derrotada nos confrontos diretos. Pelo contrário. Exceção feita ao primeiro bloco, onde teve uma fala com bom conteúdo, mas se mostrou um pouco nervosa, a presidenta apresentou números e teve respostas firmes (como na defesa do “Mais médicos” e da Petrobrás) e propostas sólidas. Reforçou politicamente seu lado – o que é o mais importante –, sobretudo ao defender o plebiscito para a reforma política, a regulação econômica da mídia e uma democracia com participação popular.

Mas, inegavelmente, a maior expectativa da noite era o desempenho de Marina, que pela primeira vez seria confrontada ao contraditório. Ora, neste sentido, e ainda que a postura da candidata tenha sido muito boa (falando de forma contundente, sem nervosismo), o debate serviu fundamentalmente para começar a desmascarar sua “nova política”: um projeto contraditório, sem propostas claras, personalista, conservador e neoliberal, (muito mal) travestido de “novidade”. Um projeto que nega a existência de classes sociais (chegando ao cúmulo de afirmar que Chico Mendes era de “elite”, tal como a herdeira do Itaú, Neca Setúbal, que é uma de suas gurus econômicas) e se orienta por um moralismo inconsequente (expresso na obscura ideia de um governo de “pessoas de bem”, “sem partidos”). Enfim, uma lástima, infelizmente, posto que acreditava (ou torcia – vide post anterior) para que, com Marina no segundo turno, o debate político avançasse. Não vai acontecer.

A expectativa que resta, agora, é saber o impacto que este início de desconstrução da novidade Marina poderá ter entre seus eleitores. A candidata que se apresenta como o novo se inclinou fortemente para a direita, com um discurso voltado para o mercado. Isso poderia lhe tirar votos, em particular daquela camada mais à esquerda de jovens que (ainda) enxergam nela a personificação do “espírito de junho”. Por outro lado, pode viabilizá-la como alternativa à direita.

Contudo, é forçoso notar que a audiência do debate é baixa, e a percepção sobre o desempenho e as propostas das candidatas e dos candidatos se dará, como sempre, a partir da narrativa da grande mídia – o que, sabemos bem, desfavorece amplamente a candidatura petista e favorece Marina, que não deverá ter suas contradições, por ora, expostas ao público.

Neste ponto, porém, entra uma última interrogação. Como era de se esperar, os jornalistas da Band que participaram do debate de ontem adotaram uma postura de ataque direto a Dilma e ao PT em todas as oportunidades possíveis. Inclusive, desviando vergonhosamente de seu papel naquele momento (tecer perguntas aos candidatos) e deixando claro seu lado. Mas ontem, da forma como foi costurada, essa posição favoreceu tanto Marina quanto Aécio, que encontraram, ambos, um reforço calculado no ataque ao governo. No entanto, dada a queda do tucano e a consolidação da ex-senadora no segundo lugar – e caso essa tendência se mantenha, o que parece bastante provável – será que a mídia abandonará Aécio e o PSDB e apoiará Marina? 

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

A campanha eleitoral na TV e o fator Marina

Nesta terça-feira tem início a campanha eleitoral no rádio e na televisão. Com ela, logo virão, também, os primeiros debates. É o momento em que grande parte da população volta seus olhos para o pleito, busca conhecer os candidatos e decide seu volto. Se isso, por si só, já torna este o grande momento da corrida eleitoral, neste ano, a campanha em nível federal, ao menos no início, terá um componente diferente e inesperado. Afinal, a trágica morte do candidato pelo PSB, Eduardo Campos, na última quarta-feira, certamente mudará o cenário da disputa presidencial - como já indicado na pesquisa Datafolha publicada nesta segunda (veja aqui).

Ainda que essa pesquisa esteja forte e propositalmente contaminada pelo impacto do acidente de Campos,  e que Marina sofra uma queda nas intenções de voto nas próximas semanas, entendo que ela ao menos reflete certa tendência: uma disputa ferrenha pela passagem ao segundo turno entre Aécio Neves e Marina Silva. Este quadro, que me parece estava quase que descartado com a presença de Campos, a meu ver, se dá por dois fatores. Em primeiro lugar, porque sua sucessora na cabeça de chapa, Marina Silva, é uma candidata mais forte eleitoralmente. Isso não só porque ela tem o recall dos votos recebidos em 2010, que a deixaram em terceiro lugar naquela eleição para presidente, mas também por sua messiânica auto-proclamação de "encarnação do espírito das ruas” que surgiu em junho de 2013, ideia que muitos compraram (Campos, por exemplo, não conseguiu, em nenhum momento, se apresentar como interlocutor dessa parcela da sociedade). Não à toa, até meados do primeiro semestre, quando seu nome ainda era testado nas pesquisas, Marina aparecia com uma margem de votos bastante superior àquela conseguida, até a última semana, por Eduardo Campos, fato confirmado na referida pesquisa desta segunda-feira. Inegavelmente, muitos desses eleitores de Marina eram/são aqueles que se identificam com a abstração política que as manifestações do ano passado acabaram representando (o “contra tudo e contra todos”, que nada mais é do que a negação da própria política), o que sem dúvida alavanca sua candidatura. Basta ver a diminuição no patamar de votos brancos e nulos entre as pesquisas anteriores e esta para notar. Em segundo lugar, como ficou claro desde o anúncio do falecimento de Campos, e se reafirmou em seu velório, a tragédia com o ex-governador de Pernambuco deverá ser explorada para fins políticos pela coligação que ele encampava, e que Marina dará continuidade, o que também deverá gerar, ao menos num primeiro momento, algum dividendo eleitoral.

Na verdade, já antes do acidente fatal de Campos, eu entendia ser muito difícil que Dilma pudesse ser vitoriosa ainda no primeiro turno, como as pesquisas têm apontado. Isso porque imaginava que, na reta final da campanha, caso as candidaturas de oposição realmente não decolassem, alguma denúncia furada haveria de aparecer para desgastar a imagem da candidata petista e lhe tirar os votos para uma vitória na primeira rodada. Com o fator Marina, ainda mais do jeito como surgiu, a perspectiva de segundo turno torna-se quase uma certeza. Mas, embora seja eleitor de Dilma, não creio que essa possibilidade seja intrinsecamente ruim. Entendo que Dilma possui capital político, realizações e um programa político concreto para vencer qualquer candidato. Não à toa, mesmo com o bombardeamento constante em cima de seu governo, as pesquisas têm lhe dão ampla vantagem sobre os adversários. Caso vá ao segundo turno contra Aécio, teremos uma reedição do embate das últimas eleições. Neste caso, a disparidade entre o projeto petista e o tucano dá todas as vantagens para a atual presidenta. Caso sua adversária seja Marina – cujo programa, para mim, ainda é uma incógnita –, apenas espero (talvez ingenuamente) que haja uma disputa de ideias e propostas progressistas, à altura da história e das tradições de PT e PSB (ou seja, que possamos ter um segundo turno mais à esquerda, sem medo do retrocesso motivado pelo fantasma do tucanato) e não uma disputa entre a política e a não-política. Isso, sim, seria terrível para o país.

No fundo, muito dos rumos dessas eleições vai depender da forma como Marina conduzirá sua campanha. Se se enveredará pela via messiânica da negação da “política tradicional” (que, insisto, da forma como está posta, é a negação da própria política) ou se formatará um programa sólido – e qual será o viés do mesmo. Mas, ainda é precipitado para avançar em análises mais profundas. Nestes primeiros dias, naturalmente, o impacto da morte de Campos ainda deixará o cenário nebuloso. Até o final do mês, no entanto, creio que já haverá condições de apontar um caminho mais seguro sobre o desenrolar dessa disputa.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Fim de um ciclo

Esta terça-feira, 12/08, marcou o fim de um ciclo em minha vida. Terminei meu doutorado em Filosofia na Universidade Federal de São Carlos, defendendo a tese “Alteridade e alienação: os impasses da intersubjetividade na filosofia de Sartre”. Tudo ocorreu bem, e fiquei muito feliz com o resultado final. Essa tese é o coroamento de um trabalho de longos anos (desde minha graduação, para ser mais preciso) e é extremamente prazeroso ver todo esse esforço  finalmente reconhecido e recompensado!

Deixo, agora, de ser estudante, depois de tanto tempo, e passo a me dedicar exclusivamente à docência. Por ora, como professor substituto do Departamento de Educação, Ciências Sociais e Políticas Públicas da Unesp, campus Franca.

A tod@s que me acompanharam ao longo dessa caminhada, especialmente aos meus pais e minha esposa, Angelica, meu muito obrigado! E a vida segue, rumo a novos desafios!

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Maquiavel e a política como disputa de forças pelo exercício do poder

Tendo em vista que começamos a campanha eleitoral de 2014, me pareceu oportuno escrever algumas linhas sobre o pai da política moderna: Nicolau Maquiavel.

Maquiavel é, possivelmente, um dos pensadores mais polêmicos (senão o mais) da filosofia política. E isso se explica, fundamentalmente, porque é com o filósofo florentino que tem início o deslocamento – que caracteriza a modernidade – entre a questão política e a reflexão ética, fazendo daquela um domínio praticamente autônomo em relação a esta última.

Mais do que o governante virtuoso ou o bom cidadão – questões concernentes ao âmbito privado e, mais ainda, assumidas como praticamente inalcançáveis nos termos antigos, tendo em vista o caráter finito e falho de nossa condição humana – o que interessa ao pensamento moderno é compreender o surgimento e as formas de exercício do próprio poder. Ou seja, como ele se mantém, e como devem ser organizadas as instituições nas quais aquele poder é exercido, sobretudo para que ele não se degenere em despotismo e tirania. Nesse sentido, a questão que o pensamento político moderno levanta é a seguinte: sem o recurso a Deus (difundido na teoria do direito divino dos reis, hegemônica na Idade Medida) ou ao conceito de “animal político” oriundo do aristotelismo, como se justifica a existência de um poder (Imperium) autônomo, criado pela própria sociedade para agir sobre ela? Como ele se realiza?

É sobre o pano de fundo deste questionamento que Maquiavel começa a operar aquele deslocamento entre ética e política, redefinindo este campo. Com efeito, dois elementos primordiais inscrevem Maquiavel na modernidade: 1) recusa à dimensão metafísica da reflexão política, abandonado em nome do realismo da “verdade efetiva” das coisas (o que o conduz à análise científica da história dos regimes políticos, especialmente de Roma, sem pressupostos teológicos ou metafísicos); e 2) confiança na ação humana como meio de transformação da vida social, ou seja, a compreensão da política como domínio da liberdade sobre o destino (fortuna).

Assim, uma das consequências mais importantes da posição maquiaveliana é compreender que a política não visa um fim de cunho moral, mas que ela se explica por uma lógica imanente a si mesma. Nas mãos do filósofo florentino, a política torna-se, portanto, uma ciência. Nesse sentido, convém observar, a primeira definição de Maquiavel acerca deste conceito é a de que a política é um exercício do poder. Logo, que sua coerência e sua eventual “moralidade” se encerram na própria tarefa de conservar o poder, garantindo a estabilidade do corpo político e, portanto, da vida social, sem a qual não é possível viver em paz e progredir (vale lembrar que a Florença de Maquiavel sofreu com numerosas crises políticas, trocas de governo etc., o que levaram à cidade à ruína).

No entanto – e essa é uma das principais novidades trazidas pela reflexão maquiaveliana – o exercício da atividade política (ou seja, do poder) se assenta na divisão social que atravessa a vida pública. Como explica, por exemplo, no capítulo IX de O príncipe: “Em todas as cidades acham-se essas duas tendências diferentes e isso vem do fato de que o povo não quer ser governado nem oprimido pelos poderosos, e estes desejam governar e oprimir o povo”. Cumpre observar que os desejos que dividem a cidade não são simetricamente opostos, mas de ordens diferentes. Não se trata da luta entre duas classes que desejam dominar uma à outra: os poderosos, sim, desejam governar e oprimir. Mas, o povo, apenas deseja não ser governado ou oprimido.

Sendo assim, é preciso complementar aquela primeira definição acerca da política: ela não é apenas exercício do poder, mas é, fundamentalmente, uma disputa de forças pelo exercício do poder. Ora, o pensamento antigo pautava a busca pelo regime ideal tendo em vista o reforço à coesão e à harmonia na vida pública. Em Maquiavel, passa-se quase o oposto. Pois, o filósofo não enxerga nessa disputa, nascida da oposição entre os desejos que permeiam a sociedade, um fator indesejável a priori, mas um caminho fecundo para a prosperidade social. Tudo depende, no seu entender, da resposta política oferecida pela sociedade para canalizar aquele conflito. O caso de Roma, neste aspecto, é exemplar.

Nos Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio, Maquiavel lembra que, em Roma, a agitação popular obrigou os poderosos a reconhecer a plebe como sujeito político, ou seja, como iguais. Assim foram criados os tribunos da plebe, câmaras compostas exclusivamente de representantes populares que atuavam junto ao Senado em defesa dos interesses plebeus. Essa saída institucional, diz o pensador, ao incluir no exercício do poder um setor outrora excluído da atividade política, promoveu um aumento da liberdade pública (da virtú popular), que patrocinou a construção da grandeza romana. Com efeito, no entendimento de Maquiavel, “as cidades crescem em poder e em riqueza enquanto são livres”, ou seja, quando seus membros têm garantia de que podem produzir e acumular bens, casarem-se e ter filhos, pois estão seguros de que poderão desfrutar de sua riqueza no futuro, tanto eles quanto sua prole. Esta segurança decorre diretamente da participação ou não no poder. Pois, na medida em que cada membro da República tem acesso ao poder – o mesmo poder dos demais, diga-se –, ele sabe que terá condições reais de evitar, por exemplo, o surgimento qualquer casuísmo que atente contra seus interesses (como uma mudança repentina nas leis, promovida por um grupo qualquer, que tome arbitrariamente seus bens ou seu patrimônio).

Nesse sentido, acrescenta ainda Maquiavel, “não é o interesse particular que faz a grandeza dos Estados, mas o interesse coletivo”. E o interesse coletivo se identifica, numa República democrática (a forma de regime mais estável, logo, mais desejável), primeiramente à liberdade e à sua preservação. Pois apenas num cenário de ampla liberdade pode-se ter segurança de que as leis serão respeitadas e que nenhum interesse particular prevalecerá sobre a res publica (coisa pública). E tendo em vista os desejos que caracterizam cada grupo social, não é difícil compreender porque o filósofo florentino reputa ao povo a defesa da liberdade. Segundo Maquiavel, há no povo “uma vontade mais firme de viver em liberdade”, porquanto a liberdade (ou seja, a participação no poder, a manutenção de seu caráter público) é precisamente a condição necessária para que ele possa se contrapor ao desejo da elite e não ser oprimido. Afinal, quando o povo é excluído do poder, ou seja, perde sua liberdade, o desejo que prevalece é a opressão por parte dos poderosos. Assim, se a política é uma disputa de forças pelo exercício do poder, é na República democrática que a atividade política encontra as condições de florescer, pois é nela em que há maior grau de liberdade para o maior número de cidadãos.

Enfim, no que diz respeito à definição do campo político, o que resta de mais importante do pensamento de Maquiavel é a tese de que, sendo uma obra exclusivamente humana, a ação política prescinde de justificativas transcendentes à sua lógica própria ou estranhas à sua dinâmica interna. Como consequência, a boa reflexão política é aquela que se atém à “verdade efetiva” das coisas, à “análise concreta de uma situação concreta”, como diria Lênin, séculos mais tarde. É este princípio que proporciona um diagnóstico exato da correlação das forças que disputam os rumos da vida social numa dada sociedade e num dado momento, permitindo ao governante a tomada de decisão mais eficaz para a conservação do poder, ou aos grupos em disputa, encontrar o melhor caminho para verem seus anseios contemplados. Por isso, ensina Maquiavel, não há espaços, na política, para generalizações precipitadas, tampouco para mistificações idealistas da realidade. Eis, finalmente, o sentido das recomendações ao detentor do poder expressas em sua obra mais famosa, O príncipe recomendações que tanto horror causaram à sua época, mas que hoje se mostram em plena consonância com a  essência da política real.

Referências bibliográficas

MAQUIAVEL, Nicolau. Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio – “Discorsi”. 3ª edição revista. Trad. Sérgio Bath. Brasília: UnB, 1994.
____________________. O príncipe. In: Col. Os Pensadores. Trad. Olívia Bauduh. São Paulo: Ed. Nova Cultural, 1999.


segunda-feira, 21 de julho de 2014

É disso que o futebol brasileiro precisa?

Quem esperava alguma sinalização de mudança após o fiasco da seleção brasileira na Copa do Mundo, certamente se decepcionou com os últimos acontecimentos no reino da CBF. Sabidamente, uma mudança radical exigiria, como primeiro ato, a saída da cúpula que comanda nosso futebol – algo que todo mundo sabe que não acontecerá num futuro breve. No entanto, alguns passos mínimos, ainda que restritos ao âmbito da seleção brasileira (única coisa que interessa a Marins e Del Neros da vida), poderiam dar fôlego àquela esperança. Mas, o que vimos, em minha opinião, foi seu sufocamento.

Primeiramente, com a escolha de Gilmar Rinaldi como coordenador geral de seleções. Retomando a pergunta que motiva o post: é de um coordenador como Gilmar que nosso futebol precisa? A resposta, a meu ver, é negativa. E explico o porquê.

Empresário de atletas até a véspera de sua indicação, e tendo como única experiência uma passagem rápida e não muito feliz pelo Flamengo no distante 1999, o ex-goleiro do rubro-negro carioca e do São Paulo não me parece um nome adequado para a função, justamente pelo evidente conflito de interesses entre sua carreira pregressa e sua nova função. Não se pode esquecer que seu grande feito na passagem pelo Flamengo foi ter “descoberto” dois jogadores dos quais viria a ser empresário tão logo saísse da Gávea: o atacante Adriano e o zagueiro Juan.

Não quero dizer que isso vá acontecer novamente; tampouco estou insinuando que Gilmar seja pessoa de caráter duvidoso. Longe disso. Mas, como diz o ditado, não basta ser honesto, é preciso parecer. E é claro que qualquer atitude que minimamente sugira um favorecimento futuro do ex-empresário ou de atletas a ele ligado, será vista com enorme desconfiança por parte dos torcedores e da imprensa. E num momento de extrema falta de credibilidade do futebol brasileiro, o que menos precisamos é que esse tipo de suspeita fique pairando no ar...

Para se somar a Gilmar, a CBF anuncia amanhã o retorno de Dunga como novo técnico da seleção. Referindo-me mais uma vez à pergunta título desta postagem: é Dunga o técnico para este momento delicado do futebol brasileiro? Antes de uma resposta, é preciso refletir.

Por um lado, é verdade que a seleção de Dunga foi possivelmente a melhor que vimos depois de 2002. A mais sólida e a mais competitiva. Apesar de erros crassos em suas convocações (de Afonso Alves à ausência de Neymar na Copa de 2010, dentre outros), Dunga montou um time que poderia ter saído vitorioso na África do Sul – o único título entre os “profissionais” que não conquistou no comando da seleção – não fosse o péssimo segundo tempo do jogo contra a Holanda. Para os mais pragmáticos, portanto, a escolha seria legítima.

No entanto, é preciso examinar algumas coisas. Em primeiro lugar, que as dificuldades daquele fatídico jogo contra os holandeses, em 2010, foram, em grande parte, frutos diretos de erros do próprio Dunga. Afinal, foi ele quem levou para aquele mundial, por sua própria vontade, por estar “preso” a alguns jogadores, um banco de reservas visivelmente abaixo da média – portanto, potencialmente inoperante em caso de alguma dificuldade, como se comprovou naquela quarta-de-final. Some-se a isso o fato de que  o único trabalho de Dunga nos últimos quatro anos, no Internacional em 2013, tenha sido um retumbante fracasso. Deste ponto de vista, mesmo a visão pragmática que justificaria a escolha do capitão do tetra pode ser contestada.

Além disso, há aqueles que defendem a escolha de Dunga pela isonomia com que tratou os meios de comunicação durante sua passagem como técnico da seleção. Trocando em miúdos: não concedeu privilégios à Rede Globo. Naturalmente, essa postura me agradou. Mas, por si só, essa posição – cujo caráter extraordinário, aliás, demonstra que o buraco do nosso futebol é mais embaixo – não basta. A meu ver, é preciso mais para conduzir a seleção brasileira.

Nesse sentido – e é este o ponto que mais me incomoda – me parece claro que o problema da seleção, e em grande parte, do futebol jogado em nosso país, é principalmente de ordem conceitual. Precisamos, há tempos, desenvolver um novo conceito de futebol, que absorva o que temos (ou tivemos) historicamente de melhor – o talento individual, a capacidade de drible e improvisação – com as exigências táticas do futebol contemporâneo. Uma nova cultura de jogo e de compreensão do esporte. Para isso, é preciso treinamento, estudo, aperfeiçoamento, trabalho duro. Até porque, há de se reconhecer que nossa safra não é das melhores (uma das expressões mais bem acabadas, diga-se, dos problemas estruturais de nosso futebol, os quais não temos condições de examinar aqui, mas que são bem conhecidos por todos – um deles, aliás, foi mencionado en passant no parágrafo anterior).

Ora, me parece que, ao resgatar Dunga, a CBF se encaminha em sentido oposto: fecha os olhos para a necessidade de uma revisão conceitual de nosso futebol – algo que Dunga demonstrou não ter condições de fazer - em nome de uma estratégia imediatista, semelhante àquela adotada por Felipão no último período: apostar no poder da camisa amarela, na mística da seleção brasileira, no “nós contra eles”, no futebol como guerra. Troca-se o trabalho por um atalho. Pode dar certo? Em termos de resultado, sim. É futebol, é um jogo, e a seu modo, o futuro time de Dunga pode se encaixar, ganhar confiança e conquistar seus objetivos. Mas, outra vez, é preciso voltar à questão central: é isso o que precisamos, pensando no papel que a seleção brasileira poderia ou deveria desempenhar na formatação geral de nosso futebol? Neste caso, não vejo como responder, senão negativamente.

De tudo isso, a conclusão que se impõe é clara – e infeliz: estamos, mais uma vez, desperdiçando uma oportunidade de ouro de recuperar o prestígio e o brilho de um dos maiores patrimônios culturais do povo brasileiro.


sexta-feira, 18 de julho de 2014

Notas sobre política internacional

Líderes dos Brics e da Unasul, na reunião de Fortaleza
Semana agitada no cenário político internacional. Ao mesmo tempo em que os ventos da mudança sopram desde o sul, velhos conflitos se aprofundam. 

Brics – comecemos pelo lado positivo. A reunião dos Brics (agrupamento de países que reúne o Brasil, a Rússia, a China, a Índia e a África do Sul) ocorrida nesta semana, em Fortaleza, trouxe a esperança de que uma nova ordem mundial está nascendo. Afinal, o principal fruto dessa reunião foi a criação de um Banco de Desenvolvimento, que servirá de contraponto às instituições financeiras já existentes, como o Banco Mundial e o FMI - hegemonicamente controladas pelos Estados Unidos e pelos países da Europa central. Um dos aspectos mais importantes do novo banco é que todos os países fundadores (os membros dos Brics) têm o mesmo poder, uma vez que o número de ações é o mesmo para cada membro (cada país entrou com uma cota de US$ 10 bilhões).

Cabe ressaltar que a proposta do Banco dos Brics é, sobretudo, financiar obras de infraestrutura em países emergentes – ou seja, não apenas os membros do grupo. Isso significa uma possibilidade de financiamento para países em desenvolvimento, que não recebem crédito suficiente das principais instituições financeiras internacionais. Nesse sentido, também nesta semana, um primeiro passo foi dado: no dia seguinte à criação do novo organismo financeiro internacional ocorreu, em Brasília, um inédito encontro entre a Unasul (União de Nações Sul-Americanas) e os presidentes do Brics. A reunião teve como finalidade apresentar os benefícios e possibilidades que o recém-fundado Banco de Desenvolvimento tem a oferecer aos países da América do Sul.

Ou seja, a política de integração dos países emergentes ganha um novo pilar de sustentação. Trata-se, sem dúvidas, do início de uma nova configuração na ordem política mundial: multipolar, pacífica, democrática e inclusiva. Uma ordem na qual os países emergentes, do “sul”, reafirmam sua busca por autonomia em face da hegemonia econômica e política dos EUA e da Europa.

Genocídio em Gaza – ao mesmo tempo em que a esperança de uma nova geopolítica mundial ganha força, é terrível o que tem ocorrido  novamente na Faixa de Gaza. Um verdadeiro genocídio por parte do Estado de Israel contra a população palestina - a grande maioria civil, que sequer tem condições de se defender. Um massacre, um crime contra a humanidade! Agora, para piorar, Israel deu início a uma ofensiva por terra, e o número de vítimas tende a aumentar ainda mais. Um desastre humanitário absoluto!

Diante disso - e do sentimento de impotência que nos acomete as imagens chocantes da covardia israelense - este blog se soma às milhões de vozes espalhadas pelo mundo que exigem o imediato cessar fogo israelense, e conclamam por um Estado palestino livre! Apenas assim, com o território da Palestina legitimado, o infindável conflito naquela região poderá ter fim, e teremos paz.

Queda do avião da Malaysia Airlines – para terminar, o ainda obscuro caso do abatimento do avião da Malaysia Airlines. Ao que tudo indica, o ocorrido trará grandes consequências diplomáticas, especialmente para a relação entre Rússia, Ucrânia e EUA. Contudo, é preciso aguardar o desenrolar dos fatos. Há ainda muito disse-me-disse. Suspeita-se, por exemplo, que o alvo não seria o avião malaio, lotado de civis, mas o jato em que viajava o presidente russo, Vladimir Putin. Teria havido, portanto, um "engano" - que, no entanto, custou quase 300 vidas!

O fato é que, seja quem for o culpado por essa barbárie, merece punição. Apenas espero, porém, que, para isso, outros tantos crimes não sejam cometidos.